A Caridade
Aviação
Marítimo
A previsão meteorológica indicava a aproximação de um sistema de baixa pressão com ventos fortes e aumento da agitação marítima.
Às 05h00, o prático desembarcou e o comandante ordenou à tripulação que assegurasse todas as amarrações e equipamentos de convés. O posto de ré foi dado como seguro, mas a tripulação deixou o posto de proa inacabado, planeando regressar mais tarde. O comandante passou a condução da navegação ao terceiro oficial e saiu do passadiço.
Durante a travessia, a ondulação intensa provocava impactos violentos da embarcação contra as vagas, acordando o comandante, que ordenou a redução de velocidade e alteração de rumo. Ao meio-dia, o segundo oficial assumiu o quarto de navegação, com ventos em aumento e vagas de três metros.
Após o almoço, o imediato foi ao convés verificar se os contentores continuavam devidamente fixados. Ao mesmo tempo, o contramestre e a restante tripulação regressaram à proa para concluir a operação de segurança. Pouco depois, uma vaga de grande dimensão varreu o castelo de proa, derrubando vários tripulantes.
O imediato encontrou quatro tripulantes feridos e soou o alarme. O comandante alterou o rumo em direção ao porto mais próximo, e os feridos foram levados para a enfermaria do navio. Considerou-se um pedido de evacuação médica (medevac), mas tal não foi possível, tendo o navio prosseguido até porto, onde os paramédicos embarcaram ao final do dia. Dois tripulantes morreram devido à gravidade dos ferimentos; outro foi submetido a cirurgia de emergência, e um foi tratado a bordo.
Na reunião de segurança antes da partida foram abordadas as condições meteorológicas e as responsabilidades da tripulação. No entanto, o acesso ao convés permaneceu irrestrito. A lista de verificação da empresa para mau tempo não foi utilizada, por não conter critérios claros para definição de “mau tempo”.
Foram perdidas várias oportunidades críticas para evitar este incidente: os tripulantes na proa deveriam ter permanecido no local até garantir que estava segura; o comandante não deveria ter iniciado a viagem sem se assegurar da segurança total da embarcação; e a passagem de serviço ao terceiro oficial deveria ter incluído o estado do posto de proa.
Com a deterioração do tempo, o comandante e o oficial de quarto deveriam ter avaliado dinamicamente a segurança do convés superior para permanência de pessoal. A ausência de orientações no checklist da empresa sobre operações no convés durante mau tempo foi também um fator causal indireto.
A resposta rápida do imediato ao alarme e a decisão do comandante de alterar o rumo foram adequadas. No entanto, a impossibilidade de realizar uma evacuação médica sublinha as dificuldades contínuas dos marítimos em aceder a apoio médico atempado. Isto evidencia a necessidade de melhorar a coordenação entre navios e serviços de emergência em terra, especialmente em áreas remotas.
Apesar de a reunião de segurança pré-partida ter abordado o estado do tempo, o acesso ao convés permaneceu livre, o que levanta dúvidas sobre a eficácia prática dessas reuniões. Além disso, os procedimentos da empresa quanto ao acesso ao convés e ao checklist para mau tempo não forneciam critérios objetivos que ajudassem a tripulação a tomar decisões claras perante o agravamento das condições meteorológicas.
Este incidente serve como um poderoso lembrete de que verificações de risco, comunicação clara e cumprimento de procedimentos de mau tempo são inegociáveis. Vidas foram perdidas — desnecessariamente. Se este relato levar apenas um tripulante a parar, refletir e agir com mais segurança, então algo de valor pode surgir desta tragédia. Não espere até ser tarde demais. Escolha a segurança — sempre.
Práticas locais – Aceitar práticas que não seguem as melhores normas de marinharia representa um risco desnecessário.
Cultura – Verifica-se uma atitude permissiva quanto à preparação do navio para o mar. O seu navio tem regras de acesso ao convés em mau tempo?
Trabalho em equipa – Com cooperação, a proa teria sido assegurada rapidamente. Não houve contestação quanto a deixá-la insegura.
Excesso de confiança – O tempo pode ser imprevisível, mas a má preparação não é.
Marítimos – “As suas ações moldam a cultura de segurança a bordo.”
Hábitos locais que ignoram as boas práticas colocam todos em risco. Fale, questione normas inseguras e colabore — especialmente em mau tempo. Se algo lhe parecer errado, provavelmente está. Você é a primeira e mais forte linha de defesa.
Gestores de navios – “O que tolera, aceita.”
A cultura de confiança excessiva ou preparação negligente começa em terra. Os gestores devem definir expectativas claras sobre como preparar o navio para o mar e para o mau tempo — e garantir que as tripulações estão formadas e apoiadas para cumprir. As auditorias não devem apenas marcar caixas — devem testar a prontidão real.
Reguladores – “Normas não significam nada se não forem aplicadas.”
Há uma diferença fundamental entre conformidade e segurança. Um navio pode cumprir todos os requisitos regulamentares e, ainda assim, ser inseguro. Os reguladores devem perceber quando as práticas locais minam os padrões globais. A intervenção deve ir além das auditorias, incluindo supervisão proativa, formação e acompanhamento. O objetivo não é apenas conformidade — é segurança genuína. E isso não pode ser deixado ao acaso.